Crítica | Ainda Estou Aqui

Candidato da Academia Brasileira de Cinema ao Oscar de 2025 chega aos cinemas nacionais no dia 7 de novembro, após receber prêmios e elogios em festivais.

ANTES DO FILME

Ainda Estou Aqui é baseado na obra literária homônima de Marcelo Rubens Paiva, que narra a trajetória de sua mãe, Eunice Paiva, e o drama vivido pela família após o desaparecimento de seu pai, o ex-deputado federal Rubens Paiva, durante a ditadura militar.

Dirigido por Walter Salles, em seu retorno às telonas após 12 anos de seu último lançamento, o longa foi exibido pela primeira vez no Festival de Veneza, em setembro e, após percorrer outros festivais internacionais, conquistou prêmios importantes, como o de melhor roteiro em Veneza e o de melhor filme pelo voto popular no Festival de Vancouver.

Além disso, Ainda Estou Aqui foi o escolhido da Academia Brasileira de Cinema para a disputa pelo Oscar de 2025 na categoria de Melhor Filme Internacional e pode até ser indicado a outras categorias como, Melhor Filme, Melhor Atriz e Melhor Roteiro Adaptado

O elenco é composto por Fernanda Torres, cuja interpretação de Eunice Paiva tem gerado destaque desde as primeiras exibições e pode até resultar em uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz. Selton Mello interpreta Rubens Paiva, e Fernanda Montenegro faz uma participação especial como Eunice aos 86 anos.

No dia 7 de novembro o longa estreia nos cinemas nacionais e promete emocionar o público. 

DURANTE O FILME

Ainda Estou Aqui se passa no Rio de Janeiro dos anos 70, no auge da ditadura militar. A trama acompanha a vida do ex-deputado federal Rubens Paiva, sua esposa Eunice Paiva e seus cinco filhos, que tentam retomar a normalidade após o retorno de Rubens de um exílio de nove meses na Europa.

O longa começa mostrando momentos felizes e descontraídos na casa dos Paiva, que vivia sempre movimentada com a presença de amigos e familiares. Essa rotina é interrompida quando agentes do Exército levam Rubens, Eunice e uma das filhas, Eliana, para depor nas instalações do DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna). Eliana é liberada no dia seguinte, e Eunice volta para casa após 12 dias, mas Rubens nunca retorna.

Eunice inicia uma busca incessante por respostas acerca do paradeiro do marido, mas encontra apenas silêncio e contradições. Ela envia cartas a autoridades exigindo explicações, mas raramente recebe respostas claras. 

Na época, Rubens ajudava outros exilados a se comunicarem com familiares no Brasil, o que despertou a vigilância do regime e levou à sua detenção.

Com o desaparecimento do marido, Eunice enfrenta, além da dor e incerteza, sérias dificuldades financeiras. A família se muda para São Paulo, e a narrativa avança 25 anos. Agora, formada em Direito, Eunice se torna especialista em direito indígena, uma das poucas no Brasil na época, além disso, torna-se um dos principais símbolos na luta pela abertura dos arquivos sobre as vítimas da ditadura.

Essa luta culmina na promulgação da Lei 9.140/95, que reconhece como mortas pessoas desaparecidas por motivos políticos durante o regime militar. Em 1996, o Estado brasileiro emite oficialmente o atestado de óbito de Rubens Paiva. No entanto, a confirmação de sua entrada no DOI-Codi, em 20 de janeiro de 1971, só ocorreu em 2012.

Eunice viveu até os 86 anos, enfrentando o Alzheimer nos últimos 14 anos de sua vida. Os responsáveis pela morte de Rubens Paiva nunca foram punidos.

DEPOIS DO FILME

É impossível falar de Ainda Estou Aqui sem exaltar a atriz Fernanda Torres, não apenas pela complexidade do papel de Eunice, mas também pelas nuances e particularidades da personagem. Fernanda transmite em tela a dor, o medo e a solidão, mas também a esperança, a obstinação e a resiliência — características que moldam a personagem após o desaparecimento de seu marido. Uma atuação brilhante e emocionante, que serve como pilar para a construção narrativa do longa.

A ambientação ao Rio de Janeiro do início dos anos 70 é incrivelmente bem realizada, desde as roupas e os carros utilizados até os elementos que refletem a rotina opressiva da ditadura militar, como os veículos e as vestimentas do exército brasileiro. A direção de arte do longa acerta ao conseguir nos transportar para a época, inserindo detalhes e elementos reconhecíveis do período.

A fotografia reforça a ambientação por meio do uso de cores menos saturadas e da predominância de tons azuis, verdes e cinzas. Além disso, em certas cenas, há a emulação de antigas câmeras de filme durante os flashbacks.

Aliás, falando em flashbacks, é importante destacar o trabalho de memória conduzido por Walter Salles, essencial para relembrar os horrores vividos após o golpe de 64. Embora o filme se concentre na história da família Paiva, ele também se configura como uma grande homenagem a todos que foram torturados, mortos e desaparecidos durante o regime militar.

A carga emocional do terceiro ato recai sobre a ausência de resolução do caso. É particularmente revoltante que, após os absurdos e crimes cometidos pelos militares durante o período, tudo permaneça sem respostas ou, mesmo com respostas, como no caso de Rubens, sem qualquer punição aos envolvidos.

Uma nação sem memória, que prefere esquecer seu passado, tende a repetir seus erros no presente. Por isso, o filme de Walter Salles é tão importante: ele exercita a memória de um país que, mesmo após tudo o que passou, teima em pedir a volta do regime militar e em eleger políticos que exaltam torturadores.

Me emocionei muito com Ainda Estou Aqui, passei todo o último ato em prantos, muito por conta do peso daquela história contada, mas também pela relevância que essa história tem em dias atuais. A mensagem que o filme passa é simples e clara: jamais esquecer.

A única coisa que consegui pensar foram nas palavras de Ulysses Guimarães: é preciso ter ódio e nojo do que aconteceu nesse país. Então lembre-se, os responsáveis e sua ideologia, infelizmente, ainda estão aqui.

10

NOTA

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