Crítica | A Perfeição – Um Acerto Sangrento da Netflix!

A Perfeição

O novo terror original da Netflix mistura diversos subgêneros do terror para contar uma história original. Mesmo com um roteiro um pouco falho, o filme é uma boa adição ao catálogo de filmes de terror da Netflix.

Antes do Filme

O novo terror original da Netflix é “A Perfeição”, dirigido por Richard Shepard. O filme originalmente estreou ano passado no Fantastic Fest e foi adquirido pela Netflix. O filme é um thriller psicológico com ares de um filme B bem sangrento e conta a história de Charlotte (Alisson Williams, de “Corra!”), outrora promissora violoncelista da Escola Bachoff de Música, dirigida pelo soturno Anton (Steven Weber). Quando Charlote encontra Lizzie (Logan Browning, a Samantha White de “Cara Gente Branca”), a nova estudante pródiga de Anton, segredos antigos virão à tona em uma trama repleta de reviravoltas. Para manter o mistério do filme, vou evitar grandes spoilers, mas é necessário um aviso de gatilho para cenas com violência sexual.

Personagens e Atuações

Allison Williams está ótima no papel principal como Charlotte, uma mulher com um imenso talento para a música que passou 10 anos da sua vida cuidando de sua mãe e agora decide recuperar o tempo perdido e corrigir erros do passado. Sua Charlotte tem uma ótima química com Lizzie, que interpreta sua virtuosa violoncelista tanto como uma mulher dedicada e com uma ferocidade sensual quanto como uma garota ansiosa, que está perdida na sua busca por aceitação. Por fim, Weber está bem como de costume no papel de Anton, com uma atuação que mostra a obsessão e manipulação de Anton de maneira visceral.

A relação entre Charlotte e Lizzie é fundamental para o filme, visto que são as melhores alunas de Anton. E tanto Allison quanto Logan conectam na sua primeira cena juntas, com o olhar aficionado de uma e o nervosismo de outra indicando que mesmo não se conhecendo, há uma história em comum entre elas. Outra relação importante é a de Lizzie com Anton, que atrás de sua fachada de mentor esconde terríveis abusos.

Trama e Roteiro

Com múltiplas reviravoltas e acontecimentos na sua trama, “A Perfeição” é um filme ambicioso para o bem e para o mal. Desde o início ele se mostra interessado em examinar a psique das suas personagens principais mas as múltiplas reviravoltas no roteiro eventualmente embolam a história, tirando um pouco a força do desenvolvimento das personagens.

Outro problema do roteiro é que quando o filme se aproxima do fim os diálogos vão se tornando expositivos. Como se o filme não tivesse conseguido desenvolver esses acontecimentos e viradas de personagem de maneira orgânica. Isso se dá em parte pelos 90 minutos de duração. Afinal se torna claro no primeiro twist que o filme não vai ter tempo para desenvolver com calma todos os temas que ele introduz em cena, se tornando cada vez mais frenético até o fim.

Essa “ansiedade” do terceiro ato, que passa em ritmo alucinante por diversas informações importantes na história, como os dez anos de Charlotte cuidando da mãe que acabam reduzidos a uma cena sentada no sofá, que tem uma rima visual interessante, com uma sequência da Charlotte adolescente e adulta sentada no sofá, na mesma posição, mostrando que ela ficou estagnada durante esses 10 anos. Vale dizer que essa mesma “ansiedade” também impôs um ritmo frenético ao clímax que funciona muito bem tanto pelos horrores apresentados em cena quanto para manter o espectador grudado na tela.

E todo o filme é muito bem filmado e editado, mesmo com um uso excessivo de flashbacks, a câmera de Vanja Cernjul traz uma tensão a todas a cenas, como se todos os segredos e tensões cuidadosamente cultivados pelos personagens sempre estivessem a um fio de cair. Como é bem representado na cena do concerto das jovens violoncelistas, em que Lizzie e Charlotte tem um momento de conexão quando ela conta as intimidades das famílias das violoncelistas.

Outro destaque fica para a edição de David Dean, que imbui ao filme um senso tensão, principalmente na nauseante sequência da viagem do ônibus, quando o filme mostra um lado de gore e body horror que funcionam quase como um aviso para mais tarde. Os momentos em que o filme “rebobina” também são muito criativos. Vale também uma lembrança a cena de sexo de dois personagens, com uma montagem e uma edição de som exemplares que expressam os sentimentos dos personagens sem necessitar de diálogos expositivos.

Depois dos Créditos

O maior problema do filme acaba sendo também seu maior trunfo, o roteiro. Ao mesmo tempo em que ele é original e ousado, trabalhando com diferentes subgêneros do terror e do suspense, como o já mencionado body horror e até o thriller erótico, e desenvolve seus personagens com profundidade, a dimensão de temas e acontecimentos que o filme busca tratar acabam se tornando demais para 90 minutos, o que leva a diálogos expositivos e motivações desenvolvidas com pressa. Outro problema é o uso excessivo de flashbacks, que aumenta durante o filme até serem repetidos desnecessariamente no terceiro ato.

Vale também uma crítica a uma cena específica no terceiro ato, que mesmo sendo essencial para o filme é feita de maneira explicita e longa demais, passando o desconforto natural que um filme com tanto sangue e mutilações vai trazer e entrando em uma área extremamente desconfortável, especialmente visto o tema tratado. Essa cena, mesmo que bem-feita, se alonga demais e vira uma batalha contra as náuseas do espectador.

Com um final criativo e que não desaponta todas loucuras apresentadas em seu tempo de exibição, “A Perfeição” é um filme ousado e imperfeito, do tipo que dificilmente se vê hoje em dia. Mesmo que prejudicado por um roteiro que não está a altura de suas (altas) ambições e por algumas escolhas questionáveis em algumas sequências, certamente é uma obra original que vai te deixar impactado.

A Perfeição

7.5

NOTA

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