Crítica | La Casa de Papel – Parte 3 – Novos personagens, novas locações, antiga narrativa

A nova temporada não surpreende na narrativa, repete mecanismos das temporadas anteriores mas traz personagens que cumprem papel satisfatório e cativam o público às máscaras de Dalí

Acaba de lançar a “parte 3” da famosa série espanhola, ganhadora do prêmio Emmy Internacional em 2018 de melhor série dramática, La Casa de Papel. A produção, anteriormente criada para uma rede televisiva espanhola, agora conta com um notável aprimoramento técnico e visual, devido aos recursos de maior orçamento advindos da atual responsável pela produção – a gigante Netflix. ALERTA SPOILER GIGANTESCO para toda essa crítica. Então, se você não está buscando spoilers, recomendo assistir primeiro, depois ler!

Temporada anterior

Ao longo dos episódios, acompanhamos o desenrolar do embate entre o Professor (Álvaro Morte) e a polícia, especialmente conflituoso por conta do envolvimento dele com a inspetora Raquel (Itziar Ituño), que acaba em um romance. No final da segunda temporada, os mascarados de Dalí conseguem fugir com êxito do assalto à Casa da Moeda e não se mostra o que fazem a seguir – sem a necessidade real de uma continuação, afinal de contas, supõe-se que após um roubo dessa magnitude, cada personagem seguiria seu rumo com a respectiva fortuna arrecadada – A partir daqui, ficou no encargo da Netflix criar uma situação na temporada seguinte para que se construísse uma continuação elementar, já que a parte dois da série não deixa o fim desamarrado.

Sinopse da “Parte 3”

Anos depois, os assaltantes comemoram nas cidades nas quais se refugiaram após o roubo. Entre eles, Rio (Miguel Herrán) e Tokio (Úrsula Corberó) vivem juntos em uma ilha paradisíaca, sem celulares e amigos, apenas com os habitantes locais. O temperamento já conhecido da personagem de Úrsula revela que ela se sente entediada e insatisfeita com a vida pacata que os dois levam desde o assalto. Isso faz Tokio romper com o rapaz, no intuito de viajar sozinha para fora da ilha, em busca de uma vida badalada mais “a sua cara”. Rio tem dois celulares satélite que conseguiu no mercado negro e entrega um a Tokio, a fim de que eles possam se comunicar de três em três dias – ressaltando que, mais para frente, vemos que era uma das proibições pós-assalto; nenhum tipo de aparelho celular – Ele telefona para Tokio em um momento de saudade, os dois pouco conversam, e a polícia consegue rastrear as localizações pelos remotos de cada um e captura Rio, pois estava “ilhado”, literalmente. Tokio consegue fugir e recorre ao Professor, que envia um transportador para trazê-la em segurança e sigilo até ele. Professor vive com Raquel nesse outro país e ela agora se apelida Lisboa, como parte da gangue. Sem notícias da prisão de Rio, Tokio e Professor desconfiam que ele está sendo torturado para ceder informações à polícia. Tokio persuade o Professor a reunir os assaltantes novamente para elaborarem um plano de resgate. Esse plano vem a ser um novo assalto, dessa vez, ao Banco da Espanha, em uma magnitude muito mais perigosa e elaborada que o anterior.

Trama e Narrativa

Não diferente do que já é conhecido, a trama de La Casa de Papel repete o conflito de assalto, mesmo dessa vez motivados pelo resgate de Rio, ao combate à tortura e a luta pelos diretos humanos. É interessante como os ladrões da gangue dessa vez se apropriam da popularidade que tem de “Robin Hoods” para ganhar suporte popular à nova empreitada, quase como justiceiros fora da lei. Eles lançam dinheiro ao povo de Madrid e apelam para a empatia da revolta contra o sistema para ganharem o apoio das pessoas, ao passo que colocam a polícia contra a parede, pois esse órgão é o que mantém a ordem do sistema corrupto que buscam combater. Além disso, o Professor atrela um plano de roubo quase impossível de seu falecido irmão, Berlim (Pedro Alonso), ao Banco da Espanha, que aparece em diversas cenas de flashbacks da época que Berlim e seu amigo Palermo (Rodrigo de la Serna) elaboravam o plano – não, Berlim não aparece vivo nessa temporada nova, como se suspeitava pelo trailer – Daí a ideia, unir o resgate e a revolta ao roubo. Sendo assim, a fórmula recorrente que alavancou o sucesso da série volta e os personagens se veem na mesma situação: um roubo, dentro de um espaço fechado, o xadrez com a polícia e os reféns. Não há uma novidade real nisso, além da amplitude que o ataque tomou depois da fama dos mascarados.

A série não sugeria uma continuação, o que torna essa volta exatamente nos mesmos moldes da primeira e segunda parte um tanto forçada, improvável e certamente pouco verossímil. Isso deixa notável o quanto a série precisa dessa receita para continuar, pois ao longo dos episódios, as mesmas estratégias são colocadas diante do espectador. Cada episódio basicamente os mostra sucedendo ao roubo, se deparando com alguma dificuldade, e o Professor sempre se safando com alguma resposta a todas as adversidades. Sempre que a polícia aparece com um obstáculo, ele tem uma carta na manga, e a montagem paralela de flashbacks, flashfowards e do presente vão entrelaçando e explicando quando tudo foi pensado e ao mesmo tempo, ocorrendo. Essa estratégia é, ao mesmo tempo a conquista e o sucesso da série, mas também uma falta de originalidade em inovar a história, levando-a a depender disso para avançar. O deleite da série se encontra justamente nesse “durante”, que faz o espectador agonizar enquanto espera para ver como os personagens vão escapar – mas o pulo do gato está no último episódio. 

Dessa vez, os ladrões não saem com sucesso do roubo, e Lisboa acaba sendo presa pela polícia. Esse gancho obriga uma nova temporada a continuar o enredo (quase como a relação da primeira com a segunda), deixando a parte 3 concluída pela desgraça do grupo de assaltantes, um pouco pior dessa vez, já que pelo menos um é preso pela polícia durante o assalto. Dentre toda a previsibilidade, ainda há novidades que refrescam a vivacidade da série: novos personagens e novas locações de tirar o fôlego. Sem dúvida alguma, La Casa de Papel tem uma direção de arte bastante particular, devido ao seu enredo. Mas, dessa vez, as idas e vindas no tempo puderam ser mais ilustradas graças ao orçamento muito maior da Netflix, o que enriquece de forma relevante a arte e a fotografia – que puderam contar com cenários ainda mais recheados, locações variadas para elucidar a história e, com isso, um aspecto visual grandioso e agradável. A qualidade técnica da série se elevou bastante, o que conta como um ponto positivo, mas ainda assim não minimiza o fator narrativo repetitivo.

Personagens e Atuações

Mais uma coisa que faz parte da graciosidade da série são seus personagens, os caricatos bandidos que tanto conquistaram fãs pelo mundo – dentro e fora da tela – Tokio novamente narra boa parte da série e cumpre bem seu papel com as falas que só ela conseguiria oferecer, devido a sua relação com Rio e ao conflito principal da narrativa. Ainda assim, todos os personagens tem seus momentos de prestígio, além de desgraça. Esse elemento auxilia no encantamento da narrativa, pois acompanhar os arcos de cada personagem durante o assalto e em seu passado constrói um mecanismo de identificação poderoso na história. Cada um com seus maneirismos que são revirados diante de tantos sentimentos e perturbações aproximam o público cada vez mais aos anti-heróis de Dalí.

Dessa vez, novas personalidades entram para acrescentar camadas instigantes às relações entre eles: Palermo – amigo de Berlim, uma das mentes por trás do assalto ao Banco da Espanha, um homossexual machista e cheio de convicções controversas -, Lisboa – a ex-inspetora Raquel, que agora ajuda o Professor com sua expertise nos protocolos policiais e vira a copiloto ao seu lado durante o assalto -, Estocolmo (Esther Acebo) – era Mónica Gaztambide no assalto anterior, agora, esposa de Denver, ela o enfrenta para participar do assalto), Bogotá (Hovik Keuchkerian) –  pai de vários filhos em vários países, o mulherengo entra na gangue para ajudar na abertura do cofre e termina atraído por Nairóbi – e Marselha (Luka Peros) – o criminoso entra no grupo para ser o olheiro de Professor ao lado de fora do assalto, além de distrair sua localização se movimentando com os celulares das ligações do mestre do crime. Além disso, alguns personagens da temporada anterior aparecem nas lembranças, como o próprio Berlim e Moscou (Paco Tous). Na polícia também entram algumas caras novas, que acrescentam tom sarcástico à história. Destaco a lunática inspetora Alicia Sierra (Najwa Nimri), uma policial grávida, responsável pela tortura de Rio e que assume o controle do assalto.

Considerações Finais

Ainda que La Casa de Papel não surpreenda nas novidades narrativas, os mesmos mecanismos das temporadas anteriores se renovam e mantém a trama interessante. Não se deve criar altas expectativas, pois a série ainda segue a mesma estrutura. No entanto, os personagens cumprem o papel satisfatório que cativam o público às máscaras de Dalí.

 

Escrito por: Roberta Braz
Revisão: Raquel Severini

6

NOTA

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